segunda-feira, 9 de abril de 2012

Ah, o coração...


uma pena que falar em coração tenha se tornado uma coisa tão antiga.
Mas o fato é que tornou-se.
Coração dilacerado, coração em pedaços, coração na mão…
Sentimos tudo isso, mas a verbalização soa piegas.
E, no entanto, estamos falando dele, do nosso órgão mais vital, do nosso armazenador de emoções, do mais forte opositor do cérebro, este sim, em fase de grande prestígio.
O que está em alta?
Inteligência, raciocínio, lógica, perspicácia!
Gostamos de pessoas que pensam rápido, que são coerentes, que evoluem, que fazem os outros rirem com suas ironias e comentários espertos.
Toda essa eficiência só corre risco de desandar quando entra em cena o inimigo número 1 do cérebro: o coração.
É o coração que faz com que uma super mulher independente derrame baldes de lágrimas por causa de uma discussão com o namorado.
É o coração que faz com que o empresário que precisa enxugar a folha de pagamento relute em demitir um pai de família.
É o coração que faz com que todos tremam seus queixinhos quando o Faustão põe no ar o quadro arquivo confidencial!
Eu gostaria que o coração fosse reabilitado, que a simples menção dessa palavra não sugerisse sentimentalismo barato, mas para isso é preciso tratá-lo com o mesmo respeito com que tratamos o cérebro, e com a mesma economia.
Se a expressão “beijo no coração” é considerada “over¿, voltemos a ser simples.
Mandemos beijos e abraços sem determinar onde; quem os receber, tratará de senti-los no local adequado.

Martha Medeiros

sábado, 7 de abril de 2012

Depois de tanto tempo...

 
 
O maior segredo do amor não é por que amamos, mas por que deixamos de amar.
Nem procure recapitular o que bebeu na noite anterior. Não tomou nada. É a ressaca da sobriedade. Um imperioso repuxo da boca.
A descoberta é sutil como perder um prendedor de cabelo. Quase insignificante como um enjoo, um cansaço. A consciência surgiu por acaso, sua origem não é bem certa, de repente na hora de escovar os dentes ou ao regar as plantas ou ao atender o interfone. Não tem lógica. Saímos do centro de gravidade que nos tornava absolutamente dependente dos gestos e das atitudes do outro. Estamos livres para pensar sozinhos e, ao mesmo tempo, presos para sempre na incompreensão.
O desamor é tão fulminante quanto a atração, mas com consequências embaraçosas. Como abandonar a militância, a ideologia, e não ser visto como um traidor? Como narrar o que não tem enredo e reunir sentido em frases soltas e ensimesmadas?
Qualquer um vai se envergonhar de contar, trata-se de um sopro, não mais de uma voz. Não é algo para perguntar, está resolvido, fertilizado de impressões.
Porque é duro sair de casa sem um motivo. Duro encarar quem amamos tanto tempo sem oferecer nenhuma explicação adequada e convincente para o fim. Duro conversar sem mesmo entender como ocorreu a passagem de lado, de uma fidelidade extrema e desesperada à indiferença. Duro executar a tarefa, sabendo que alguém aguarda ansiosamente uma palavra para desaguar os traços, uma palavra onde possa colocar a culpa e amaldiçoar nosso nome. Esse alguém precisa da palavra que não temos, como um pai ou uma mãe do corpo desaparecido do filho.
Vive-se a tragédia de não ter uma tragédia para desencadear a briga. Não haverá uma causa específica para a distância. Fugiremos do contato visual, por não corresponder mais às expectativas.
Receberemos a fama de mentiroso, de fraco, de que estamos escondendo a verdade. Muitos forçam uma causa, para descontar o preço da loucura. Muitos revisam os últimos movimentos para justificar o término. Muitos mentem para não passar trabalho. Muitos tentam diminuir a injustiça inventando fatos.
O que aumenta a penumbra é que incrivelmente nunca mais encontraremos nosso par, apesar de viver na mesma cidade, frequentar o mesmo bairro, dividir gostos semelhantes. Nenhum esbarrão no mercado ou no banco. Os amigos em comum apagam as pistas. Não dá para compreender se mudamos os hábitos ou os hábitos não nos pertenciam mesmo e queríamos agradar pensando que eram nossos.
Minha namorada reviu seu ex num bar. Ele estava acuado com o imprevisto, cumprimentou nervoso ao invés de ajudar o rosto a sorrir. Ela foi ágil, venceu as cadeiras de ferro, as mesas truncadas, esforçou seu quadril para criar interesse e perguntou o que ele andava fazendo. Eu assisti ao enlace esperando o momento de ser apresentado.
Sondei o que passou pela cabeça de Cínthya: aquele rapaz simpático, de cabelos compridos e óculos ingênuos, foi um dia seu melhor, que ela também foi um dia o melhor dele. Ela tinha que mostrar ternura e não me ferir de ciúme. Ele tinha que apresentar confiança e não se abalar comigo.
A emoção ficou represada ou talvez já houvesse secado. A questão é que não se falavam durante cinco anos. Idealizaram um reencontro que não aconteceu. Não existe justiça depois da separação.
 Fabrício Carpinejar

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Canibalismo emocional...


Às vezes eu sinto que vivemos numa bolha.
Não é o mundo-quitinete da classe média paulistana (ou carioca, ou brasiliense, ou recifense...), em que as pessoas se esbarram o tempo todo na porta do cinema e do restaurante. Tampouco é o mundo virtual da internet, no qual passamos horas mergulhados, entre caras conhecidas, no Facebook, no Twitter, no Instagran...
Não, a bolha a que eu me refiro é um espaço ainda menor, no qual só cabem dois corpos que decidem, em comum acordo, dividir juntos o espaço e o tempo. Falo de relacionamento, namoro, casamento. Falo da vida de casal.
Vocês já repararam como esse negócio tem uma tendência espetacular a nos confinar? Em torno de duas pessoas felizes vai se criando uma película invisível que as separa do mundo e, paradoxalmente, tende a asfixiar a felicidade.
No início, ficam de fora desse habitat restrito os amigos mais íntimos, justamente aqueles que costumavam estar mais próximos na vida do solteiro ou da solteira. Depois, vão sendo afastados, sem que a gente perceba, os amigos e colegas do segundo círculo de relações, aqueles com quem a gente costumava sair para tomar cerveja, viajar e ter conversas de valor inestimável sobre o trabalho e a vida. Por fim, e simultaneamente a isso tudo, a gente se afasta também da família, que vai sendo sutilmente negligenciada em nome dos planos e da preguiça do casal.
Ao final desse processo, um belo dia, a gente percebe que ficou sozinho numa bolha com a pessoa de quem gosta – e que entre nós e o resto do mundo existe agora uma grossa camada de indiferença.
Dentro dessa bolha, claro, ocorrem coisas maravilhosas. A intimidade física e psicológica do casal floresce, o autoconhecimento de cada uma das partes se amplia enormemente e cresce, no interior da vida a dois, uma deliciosa sensação de afeto, amparo e segurança. Dentro da bolha jamais estamos sós. Falamos com o outro o tempo inteiro ao telefone. Trocamos emails ao longo dia. E, se acordamos assustados no meio da noite, a outra metade está lá, respirando firme e tranquila ao nosso lado.
De muitas maneiras, essa é a situação com que sempre sonhamos. Quando fantasiamos romanticamente sobre uma relação, ela acontece em cenário fechado – somos nós, nosso amor, nossos planos e nossas realizações, com uma vida social que permita partilhar, de vez em quando, a nossa radiante felicidade privada. Assim são os casais nos filmes, assim acontece nos romances baratos. Assim pode ser a nossa vida, se quisermos.
A questão é, deveríamos desejar apenas isso?
Eu suspeito que não. Uma parte de mim, que já passou por isso, percebe uma armadilha na bolha da felicidade. Ela cria um ambiente que não se renova. Ela fomenta o canibalismo emocional – eu me alimento de você e você de mim – e encurta as nossas dimensões existenciais. Ao mesmo tempo em que crescemos para dentro da relação, corremos o risco de encolher para o resto do mundo – e reduzir, drasticamente, o alcance potencial da nossa vida. A felicidade hermética dos casais é autocomplacente e, lá na frente, pode ser frustrante. Bem frustrante.
 Minha sensação é que casais não são auto-sustentáveis, no sentido ecológico da palavra.
Os casais precisam de energia de fora para se renovar. Precisam da presença constante e questionadora dos amigos. Precisam das raízes e do compromisso da família. Precisam de uma vida social que inclua desafios e não apenas entretenimento. Os casais precisam encontrar, fora da bolha, motivos reais para sonhar e existir. E precisam, desesperadamente, da individualidade vigorosa de suas partes, que não se desenvolve sem o contato com o mundo.
Quando eu era garoto, as utopias estavam na moda. Imaginava-se, imaginávamos, que o mundo mudaria rapidamente, e de uma forma radical. Casais seriam parte essencial da grande e harmoniosa cumplicidade humana. Não se admitia que as pessoas pudessem se isolar egoisticamente dentro do seu amor. Era preciso participar do mundo. Transformá-lo.
Frequentemente, eu tenho a sensação de que esse impulso generoso nos faz falta. Na ausência dele, depositamos uma parcela exagerada das nossas expectativas no projeto privado das relações afetivas. Quando estamos sozinhos, somos tomados pela urgência de achar alguém e construir um universo de casal. Quando achamos pessoa certa, nos pomos a trabalhar, laboriosamente, às vezes de olhos fechados, na tarefa de nos fechar ao mundo junto dela. Temos medo.
Mas, viver assim, eu suspeito, não é boa ideia. No interior da bolha, mesmo das mais felizes, acaba faltando ar. Dentro dela, somos tentados a nos curvar sob as dimensões cada vez menores do mundo que criamos. Assim, quando a bolha explode - como é da natureza das bolhas explodir -, expõe ao mundo duas pessoas surpresas e desamparadas, que se sentem infinitamente sozinhas. E de mãos vazias.
Eu sugiro, portanto, que os casais não façam bolhas duradouras. Ou, pelo menos, que abram na parede delas portas e janelas por onde possam circular pessoas e ideias - passagens por onde a vida exterior possa entrar não apenas como mera decoração da felicidade, mas como ar, como água, como coisa vital e renovadora que a vida é.  

Por: Ivan Martins

sábado, 24 de março de 2012

Quando o amor acaba e o outro vai embora. O que fazer com a dor?


Uma dor que parece insuportável, interminável, inexplicável... Uma dor que insiste em se fazer notar, que traz ao pensamento, minuto a minuto, a pessoa amada, o amor acabado, a relação falida... O que fazer? Como superar essa situação que parece definitiva, que parece insuperável?
Vejo muitas e muitas pessoas sofrendo e se destruindo por um amor desgastado, desenganado e, muitas vezes, morto! Pessoas que não se conformam com o final de seu romance, que seriam capazes de arrastar por anos e anos um relacionamento sem confiança, sem reciprocidade, sem companheirismo, coagido pelas discussões, críticas e falta de compreensão... Simplesmente para não assumirem o fim!
Por incrível que pareça, por mais difícil que seja admitir que o brilho se apagou, que a paixão esfriou e que as expectativas cansaram de se frustrar, é muito melhor abrir mão de uma relação morta do que se autocondenar a viver num mundo que, na verdade, não existe mais!
Existem muitas razões para que um amor morra: falta de diálogo, medo de se entregar, desconfianças, ciúme excessivo, egoísmo exagerado, diferenças morais, religiosas ou até uma terceira pessoa - que já existia ou chegou depois... Mas a verdade é que nunca há somente um motivo.
Inconscientemente ou não, propositadamente ou não, o fato é que há sempre uma lição a ser aprendida, mesmo por aquele que está sofrendo, mesmo por aquele que não quer abrir mão do amor, independentemente de sua condição.
Então, a pergunta seria: por que manter uma relação que já não traz felicidade, que transforma cada dia numa batalha, que faz com que o outro se sinta pequeno, constrangido, decepcionado, angustiado e até sem vontade de viver?
Medo de começar de novo, sozinho, sem a muleta que lhe colocava no lugar de vítima? Medo de encarar a família, a sociedade e a sua própria consciência? Medo da solidão, da sensação de derrota, do vazio que inunda o coração? Medo do que mais? O que pode ser mais doloroso do que um amor pisoteado, abandonado, esquecido, destruído? O que pode doer mais do que a mentira, a indiferença, a ausência de corpo presente, a crítica constante, o desafeto, a traição (em todos os sentidos)?
Então, se você sente dentro de si um vazio que perturba, que dói, que faz com que tudo perca a graça e que tira a sua alegria de viver, eu sugiro: pare de tentar preencher esse vazio com qualquer coisa, com qualquer um, com um amor que já não tem mais condições de preencher nada... Olhe para esse cantinho frio e triste que existe dentro de você e convença-se de que para preenche-lo você precisa torná-lo atraente e saudável!
Aprenda com a dor. Cresça com o sofrimento. Evolua e se torne uma pessoa melhor toda vez que perceber um erro que cometeu, uma participação sua na destruição dessa relação. Essa é a missão de todo ser humano! Esse é o segredo do amor.
E assim, amadurecido, mais consciente e preenchido de um amor-próprio que até então você não conhecia, você estará se preparando para o novo, para um recomeço com muito mais chances de dar certo! E, quem sabe, até para reconquistar, de fato (com atitudes e um novo jeito de amar) a pessoa que foi embora...
Realmente não é fácil, mas é absolutamente possível. Por isso, ao invés de massacrar o seu coração insistindo num amor que já acabou, cultive a sua auto-estima, veja-se como merecedor de um grande amor e abra-se para uma nova oportunidade de amar, mais preparada e mais você!

:: Rosana Braga ::

quarta-feira, 21 de março de 2012

Onde se acha o amor...


É preciso estar no lugar certo para que o destino ajude.
Apesar da existência da internet, os encontros amorosos ainda ocorrem no mundo físico. É preciso sair de casa, conhecer pessoas e dar ao destino uma chance de fazer algo por nós. Quando, na noite de sábado, a garota sem namorado decide ir a uma festa com os amigos, em vez de ficar em casa fuçando os perfis dos outros no Facebook, está fazendo um cálculo preciso: onde é maior a chance de conhecer alguém? Está provado, estatisticamente, que o amor não é um homem estranho que bate na porta com um ramo de flores, uma camisinha no bolso e um bilhete de avião para Paris.
Isso sempre me ocorre quando escuto – o que é frequente – duas mulheres discutindo sobre a tarefa aparentemente difícil de arrumar um namorado legal nos dias que correm. Em geral, fico tentado a me meter para sugerir que elas talvez estejam buscando nos lugares errados. Hoje, eu decidi que iria ceder à tentação e dar uns palpites nesse assunto. Depois de conversar com amigos e amigas, divido com vocês as opiniões que achei pertinentes.
A primeira delas, que vai irritar os boêmios: não ponha esperança demais em botecos e baladas. Eles não costumam ser o lugar onde se encontra gente que vai ficar na sua vida. Para uma mulher ou para um cara atraente, é fácil achar sexo na noite, mas o que acontece depois é muito incerto. O mais comum é acordar sozinha, ou, ainda pior, perceber que a pessoa ao lado não tem nada a ver. Decisões tomadas no calor da mesa ou da pista não costumam resistir às horas de sono ou de lucidez. Se você já conhece a figura e a convida a tomar uma, a chance de rolar aumenta muito. Se você vai à balada sabendo que lá vai estar o cara que você deseja, melhor. Mas, sair na sexta-feira, dos bares para a balada, na esperança de que o príncipe encantado apareça do nada, com uma lata de cerveja na mão, pode ser bem frustrante.
 A internet tornou-se um lugar privilegiado de encontros, mas seu efeito nas aproximações é ambíguo. Funciona de uns jeitos e não funciona de outros. Usar o Facebook para se aproximar da garota do trabalho que você acha bonita ou do cara que você conheceu na festa do amigo costuma ser legal. Tem gente para quem isso funciona tão bem que virou abordagem padrão - com a vantagem de que a redes sociais contam muito sobre a pessoa antes de você chegar perto dela. O que eu acho que não rola é usar a internet para se aproximar de completos estranhos: viu uma foto no timeline, achou a pessoa bonita, manda uma mensagem, “oi!” Quem recebe esse tipo de torpedo fica com a impressão que do outro lado tem um cara ou uma garota disparando span para todos os lados. Não é legal.
Na internet estão também os famosos serviços de promoção de relacionamentos. Você se cadastra, paga uma grana e o sistema sugere sair com fulano ou sicrana. As (poucas) pessoas que eu conheço que já fizeram isso conseguiram encontros e transas. Têm histórias divertidas para contar, mas nenhuma achou o amor virtual. Parece ruim? Não necessariamente. Para quem está por baixo e sente que a vida empacou, esse tipo de serviço pode funcionar como o socorro que a seguradora manda quando seu carro ficou sem bateria: oferece uma recarga de autoconfiança, faz com que você dê a partida e põe o carro em movimento. Às vezes é tudo que a gente precisa.
Quando se trata de encontrar pessoas, eu acredito em grupos: escola, trabalho, amigos. Em geral é aí que as coisas rolam. Melhor que a balada anônima é uma festa de aniversário, onde você já conhece parte das pessoas e tem a chance de conhecer outras, que terão alguma conexão com você. Amigos de amigas são candidatos naturais a namorados. Eles já chegam filtrados por interesses e origens comuns – aquilo que uma amiga minha chama de “indicação”. Ela, efetivamente, sai perguntando aos conhecidos sobre os caras que acha interessante: “Você acha que eu combino com ele?” O grupo ajuda a recomendar e selecionar.
Se você está sem grupos, invente um. Cursos são lugares espetaculares para aprender e para conhecer gente. Há cursos de todos os tipos e neles há todo tipo de pessoas. Pode ser um encontro de gastronomia, um curso de teatro ou aquela aula de dança de salão que você está adiando desde que tinha 18 anos. Funciona. Tampouco descarte as viagens em bando ou grupo organizado. Elas costumam ser divertidas e oferecem a oportunidade de conhecer pessoas com o mesmo pique. Depois de três dias fazendo tracking na Chapada Diamantina ou acampando no Pantanal, todo mundo fica meio íntimo – e há reuniões posteriores, trocas de fotos pela internet. As coisas não acabam ali.
O essencial, quando se trata de encontros amorosos, é criar oportunidades para que eles aconteçam. Na tarde de sábado, por exemplo, por que não chegar ao cinema meia hora antes do filme e tomar um café, sem Ipod nos ouvidos e sem estar mergulhada num livro? Isso oferece a quem está em volta uma chance de aproximação. Às vezes isso é tudo que o destino precisa para colocar a pessoa certa na mesa ao lado, sozinha e louca para conversar. Pode não ser o grande amor da sua vida, mas talvez venha a ser um bom amigo – que talvez tenha um irmão, ou um amigo, que nasceu com a missão de dar a você os melhores dias da sua vida.

Por Ivan Martins

sábado, 10 de março de 2012

Palavras são inúteis...


A gente cresce acreditando no poder das palavras. Desde criança, nos dizem que, conversando, seremos capazes de acertar qualquer coisa, de resolver qualquer situação. Infelizmente, não é verdade. Quando se trata de relacionamentos, as palavras são inúteis.
Os sentimentos apaixonados que nos ligam a alguém não são criados por palavras. Os desentendimentos que aos poucos ou de súbito nos separam da pessoa não são provocados por palavras. Os sentimentos de perda, dor e morte causados pelas rupturas tampouco são remediados por palavras. As palavras descrevem, celebram, exaltam e lamentam nossas paixões, mas não são responsáveis por elas. Quando se trata de amor, as palavras são inúteis.
Não obstante, nós falamos. Cultivamos a ilusão de que o outro pode ser envolvido, seduzido, convencido pela nossa retórica. Acreditamos, fundalmentalmente, que o nosso desejo pode ser transmitido pela palavra. Por isso, telefonamos, mandamos mensagens, escrevemos longos emails, rabiscamos poemas, fazemos letras de música, marcamos conversas dolorosas e intermináveis que – a rigor – não levam a lugar nenhum.
Quando existe um sentimento comum, as palavras são apenas acessórias. Quando não há sentimento, elas agem como um bisturi: cortam, expõem e dilaceram, mas não criam.
Tenho a impressão de que aquilo que liga dois seres humanos existe além das palavras. Uma magia de natureza física ou psíquica dita que Fulana é atraída por Sicrano ou vice-versa. Isso acontece de forma instantânea, ou pode ser construído lentamente, mas não sobre o alicerce das palavras. As palavras são apenas a aparência do que nos liga. Quando as pessoas conversam, trocam entre si códigos que vão além do que elas dizem. Há os olhos, as mãos, o corpo e a voz, que sinalizam uma espécie de todo invisível. Há um conjunto de sinais nos quais um se expressa e o outro se reconhece – e deseja, ou não deseja. O sentido das palavras nessa troca é secundário. A mensagem profunda sobre quem se é já foi passada antes.
Se isso não nos parece tão claro é porque vivemos num universo revestido de palavras. Temos a sensação de que elas iniciam e finalizam todos os atos, mas não é assim. As palavras são apenas sintomas. Quando as pessoas se conhecem e se apaixonam, conversam da mesma forma como se beijam, com fúria e com encantamento. No final, quando tudo acabou, as palavras doem e escasseiam. Elas são repelidas pelo outro da mesma forma que o toque, igual que o olhar. Temos a impressão de estar encerrando o amor com as palavras, mas elas são apenas as flores do enterro. Quando chegamos a elas, o desejo está morto.
Infelizmente, os ciclos de paixão e rejeição não são simultâneos. Eu ainda estou cheio de palavras doces, mas você não quer mais ouvi-las. Ou eu me dirijo a você com palavras de desejo e prazer, mas elas deixaram de fazer sentido. Se você não sente mais o que eu sinto, não vai entender o que eu digo. Nem será tocada pela magia das minhas palavras, que se tornam inúteis. Quantas das nossas conversas não são trocas de palavras inúteis? Tentamos transpor com elas o abismo da indiferença do outro. Explicamos, sugerimos, argumentamos - inutilmente.
Então, economize palavras. Fique quieto e preste atenção. Escute o que ela não diz. Entenda o que ele nem falou. Os gestos contam coisas, os olhares antecipam. Atitudes valem mais do que declarações de amor – e não podem ser substituídas ou consertadas por palavras.

Ivan Martins

segunda-feira, 5 de março de 2012

Aqui, agora, de todo coração...


Escolher é difícil. Pergunte a um psicólogo e ele vai explicar por que gente obrigada a optar entre uma coisa e outra – qualquer que sejam essas coisas – sente ansiedade. Isso acontece em lojas de sapato, em restaurantes, na porta do cinema e até no sexo. Uma amiga me contou outro dia como foi estar numa festa e ter dois homens sedutores dando em cima dela. “Tive de escolher um deles, mas com um aperto no coração”, ela me disse. No dia seguinte, o bonitão que ela escolheu caiu no vácuo e nunca mais deu notícias. Escolher, ela aprendeu, é abrir mão de alguma outra coisa - e as consequências podem ser irreversíveis.
Infelizmente para nós, nem todas as escolhas são tão simples quanto a do sexo na balada. Penso na escolha mais delicada que a gente faz na vida, aquela que envolve os parceiros de longo prazo. Em que momento concluímos que uma pessoa deixou de ser apenas item de prazer ou fonte de encantamento e se tornou a criatura com quem vamos dividir a vida? Pode ser casando, comprando apartamento e tendo filhos, ou, de forma menos ritualizada, pondo os sentimentos e necessidades dela no centro da nossa vida, mesmo vivendo em casas separadas. O compromisso é parecido, assim como os caminhos que levam a ele.
A primeira coisa que conta nas grandes escolhas – eu acho - é a permanência. Ninguém tem direito a reivindicar um posto dessa importância sem ter ralado um tanto. Não adianta a Fulana decidir, em 30 dias, que vai ser sua mulher para o resto da sua vida. Não funciona assim. O teste do tempo é fundamental. Se aquela mulher ou aquele sujeito continua lá depois de todas as discussões e inevitáveis desencontros, se ela ou ele resolveu ficar depois de todas as chances de ir embora, se os seus sentimentos em relação a ele ou ela continuam vivos, um bom motivo há de haver.
É essencial, também, que a experiência de convívio seja boa. Amores tumultuados dão bons filmes e péssimas vidas. É essencial acordar no sábado e ter vontade de ficar mais tempo na cama, enrolado naquele ser ao seu lado. Se a conversa antes de dormir deixou de ser gostosa ou se qualquer programa parece mais interessante do que a companhia dela ou dele, para que insistir? O prazer que o outro proporciona é essencial. Prazer de transar, prazer de olhar, prazer de ouvir, prazer de simplesmente estar. Se você caminha pela rua com ela e os dois são capazes de rir um com o outro, algo vai bem. Se você passa a tarde com ele no sofá, lendo ou transando, e o dia parece perfeito, eis um bom sinal. A felicidade não tem receita, mas a gente percebe quando está funcionando.
Para que as coisas funcionem no longo prazo é essencial haver lealdade. Eu cuido, eu protejo, eu respeito – e você faz o mesmo comigo. Se você não sente que seus sentimentos e a sua vida são importantes para ele ou para ela, desista. Como o ambiente lá fora é hostil, é essencial saber que no interior da relação existe cumplicidade e abrigo, com um grau elevado de honestidade: você diz o que pensa e isso vai ajudar, ainda que doa. É impossível prometer que coisas ruins jamais irão acontecer, é falso garantir que os sentimentos permanecerão os mesmos para sempre, mas é essencial olhar nos olhos do outro e sentir a disposição de tentar, verdadeiramente, que seja assim. Aqui, agora, de todo o coração, tem de ser para sempre – ou então a gente nem começa.
Se tudo isso existir – e não é fácil – ainda fará falta um quarto elemento, essencial ao equilíbrio duradouro das relações: os planos. Se ele que ter cinco filhos e você não quer ser mãe, não vai rolar. Se ela quer levar uma vida de viagens e aventura e o seu sonho é ficar aqui mesmo, perto das famílias e dos amigos, não deu. Viver bem pressupõe afinidades essenciais de gosto, sentimento e expectativas, sem falar de ideologia. Todas essas coisas se refletem nos planos. Eu penso no amor como um voo de longa distância. O avião precisa estar carregado com o tempo da relação, com o prazer que ela proporciona e com a lealdade em que ela está baseada – mas as pessoas ainda têm de concordar sobre o destino. Se eu quero ir à Tóquio e você à Nova York, precisamos embarcar em vôos diferentes.

Ivan Martins