quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Seja Feliz...





Um dia qualquer, pode ser quarta-feira na hora do almoço, seu ex-marido telefona para contar que está namorando. Talvez ele mande uma mensagem de celular ou um e-mail. Não faz diferença. Você recebe a notícia e, instantaneamente, as imagens ao seu redor saem de foco. Você respira fundo, tenta se recompor, mas a voz da pessoa com quem está almoçando vai ficando cada vez mais longe. Por alguns segundos, você ouve apenas o seu próprio batimento cardíaco, sangue pulsando com som estereofônico nos ouvidos. Acha que vai desmaiar. É uma sensação assustadora, que, ainda bem, desaparece como veio. Então você se ajeita na cadeira, retoma a conversa, e, penosamente, começa a viver sua nova realidade.

Quanto tempo faz desde a separação – um ano, oito meses? Você já deveria estar preparada. Ele é um cara legal, bonito, afetuoso, uma hora aconteceria. Claro, vocês andaram trocando mensagens no final do ano, ele ficou com o seu cachorro durante as férias, talvez você achasse que as coisas estavam de alguma forma se ajeitando. Mas não.

Em todo esse tempo, repare, ele nunca tentou tocar em você, nunca a convidou para fazer nada romântico. Ele a procurava de vez em quando, é verdade, mas sempre para falar dos problemas que o afligiam no trabalho, na família, nas relações com os amigos. Você confundiu a intimidade que persistia entre vocês com alguma forma de romance, mas não era o caso. O romance estava guardado para outro alguém, que pelo jeito apareceu.

Não há o que censurar, você bem sabe. Durante esse tempo você também esteve tentando, procurando, se divertindo. Gostou daquele cara tatuado – lembra? -, mas ele não quis mais sair. Houve aquele outro, do beijo no meio do jantar. Você jurava que iria rolar, mas não. Antes de sentir-se vítima das circunstâncias ou das pessoas, lembre dos homens que você esnobou. Eles ligavam, procuravam, persistiam, mas com eles você não queria nada. Faltava química, vontade de rever, saudades. Senão você estaria namorando.

A verdade é que você não se apaixonou desde a separação. Ele se apaixonou. Não há injustiça.

Sua analista deve ter razão naquela conversa sobre tempo. Você acha que está pronta para recomeçar, mas algo dentro de você diz que não. O tempo da subjetividade não é o tempo do calendário. Você gostaria de apressar as coisas, amar de novo, silenciar o relógio biológico, deixar de pensar no desgraçado. Mas não. Você tem algo a aprender nesta casinha antes de avançar para a próxima. Pare de reclamar e tente descobrir do que se trata.

É muito fácil – fácil demais, na verdade – dizer a você mesma que é louca por ele e que por isso a sua vida não avança. Mas será verdade? Se você for absolutamente honesta, terá de admitir que seus sentimentos não são claros. Você não tem mais certeza. Desde a separação aconteceu tanta coisa. Sua vida mudou tanto. Tantas pessoas entraram e saíram. Em muitos dias você se sente mais bonita, mais animada, vivendo mais a vida do que antes. Obviamente, sente falta de amar e ser amada, mas isso significa, realmente, que ainda ama o seu ex?

Sua amiga mais querida disse o óbvio: a novidade pode lhe fazer bem. Saber que ele está em companhia de outra mulher - transando, fazendo planos, rindo baixinho na fila do cinema, de mãos dadas na avenida Paulista – pode ser libertador. Talvez assim se rompa o vínculo subjetivo que vocês dois insistem em manter. A notícia de que ele está namorando pode permitir que os sentimentos aflorem na direção de outros caras. O fim de uma ilusão pode ser o começo de alguma outra coisa.

Por favor, por favor, não vá transformar o telefonema dele em mais um motivo para acreditar em coisas que não existem. Ele foi gentil, apenas isso. É o jeito dele. Não queria que você soubesse por outras pessoas, não queria que fosse magoada por fofocas. Disse que você não conhece a moça, que ela não é do convívio de vocês. Melhor assim. Se ele não a procurou pessoalmente para dar a notícia, o que isso significa? Nada. Apenas uma decisão dele, quem sabe uma ambiguidade. Mas o gesto dele é inequívoco: está escolhendo outra mulher, mesmo sabendo que seria acolhido se voltasse a você. O que as pessoas acham que sentem não tem importância. Importante é como elas agem, e ele agiu com absoluta clareza.

No dia da conversa ao telefone, você desejou que ele fosse feliz. Estava desnorteada, é verdade, mas a frase espontânea não foi uma mentira, nem mesmo uma bravata. Era dolorida, mas verdadeira. Claro que você tem ciúmes, mas você não quer que ele se perca por aí, como tanta gente. Pelo contrário. De alguma forma, você sabe que a sua capacidade de ser feliz implica em aceitar, genuinamente, que ele viva bem a vida dele. Se você ficar presa a ele por algum sentimento ruim, isso vai atrapalhar a sua vida, não a dele. Você sabe.

“Seja feliz”, você disse a ele. Fez muito bem. Agora, com toda sinceridade, com amor, repita a frase para você mesma. Seja feliz, cuide-se, trate-se, descubra quais são e onde estão os seus desejos. Use essa oportunidade para alçar voo. Ache em você energia para mudar a sua vida, para obter aquilo com que sonha, para encontrar um amor para a próxima década, até 2027. O amor de ontem, infelizmente, não existe mais. Quer dizer: ele existe, mas mudou de destinatária. Agora, é sua vez de reendereçar o seu amor e começar de novo. A melhor maneira de fazer isso, talvez a única maneira, é desejando com a sinceridade possível que seu ex-amor seja feliz - tão feliz quanto foi com você, ou ainda mais.
Ivan Mrtins

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